“Hi, this is Ricardo from Loud!”

MELVINS
A Arte De Bolsar

Os Melvins, a modos que, dispensam apresentações. Não obstante, os quatro ilustres testemunhos que apresentamos reflectem bem a importância desta banda e o seu papel de protagonismo em resolver problemas do planeta como a fome ou o aquecimento global e trazer a paz ao Médio Oriente. Com um EP para download gratuito, «The Bulls And The Bees», e um novo trabalho com Trevor Dunn, «Freak Puke», sob o epíteto de Melvins-Lite, tivemos um pretexto para roubar alguns minutos a King Buzzo na última data da sua tournée americana.

Por Ricardo S. Amorim

Olá Buzz. É boa altura para conversarmos?
Olá, sim e desculpa não ter falado contigo há pouco, mas estava a conduzir e apanhei trânsito e também havia polícia na zona. Enfim, uma confusão, mas já chegámos ao clube onde tocamos esta noite.

És tu que conduzes a banda em tour? Isso não é cansativo depois de um concerto?
Creio que sim… não sei. Olha que eu não sou um wimp! Posso ser um gajo velho, mas não sou uma velha. Além disso, adoro conduzir.

O Dale e o Coady também têm tido trabalho extra nesta tournée, tocando bateria com os Unsane, não é verdade?
É verdade, e foi a coisa certa a fazer. O baterista deles têm tido muitos problemas de saúde, sérios, e desejamos-lhe todos o melhor. Mas os concertos de Unsane têm corrido bastante bem e o Dale e o Coady têm feito um excelente trabalho. São grandes bateristas e são boas pessoas. Fizeram o que tinha de ser feito.

É um grande cartaz. Falámos com o Chris Spencer [Unsane, na Loud! #134] semanas antes e estava bastante entusiasmado com a digressão.
Concordo e não sei como é que nunca tinha acontecido antes. Tem corrido bastante bem, boas afluências e eles são uns tipos porreiros. Divertimo-nos e somos todos músicos “living the dream”.

E parece que têm cada vez mais gente nos concertos. Qual o segredo para conseguirem rejuvenescer o vosso público?
É verdade. Os mais velhos vão desaparecendo mas temos mais jovens a assistir aos nossos concertos. Por volta dos 35 anos, as pessoas começam a ter outras vidas e não vão tanto a concertos, ao passo que os jovens descobrem a banda. Têm filhos e carreiras e não é que não gostem de música mas já não têm a mesma disponibilidade. Enquanto isso, há putos que se fartam da música que ouvem e procuram bandas mais esquisitas, e aí encontram-nos a nós.

Actualmente fazem, quase sempre, tournées como headliners. Considerarias voltar a tocar com bandas grandes e poder alargar o vosso público, como fizeram no passado com White Zombie ou Tool?
Faria uma tournée com White Zombie se me pagassem cem mil dólares por concerto. De outra forma, vão-se foder. Mas de que outras bandas falas?

Assim de repente… sei lá, os Metallica?
Faria sempre uma tour com os Metallica se fosse por muito dinheiro. Não teria outro interesse para aturar os Metallica e os seus egos gigantes, mais a sua estúpida roadcrew. Preferia dar um tiro na cabeça. A não ser por muito dinheiro, preferia beber o mijo da pila de um cão morto a ter de o fazer. Mas por muito dinheiro, sim faria a tour.

Não é muito politicamente correcto um músico dizer que faria algo por dinheiro, hoje em dia, não concordas?
Mas seria apenas por isso, eu gosto das nossas tournées. Aturar uma banda estúpida como Metallica teria de ser por muito dinheiro, e estou-me a cagar para o politicamente correcto. Já aturei muita merda e não estou para isso. Mas é um cenário que não se coloca, por isso não tenho de me preocupar.

Falando em dinheiro, hoje em dia toda a gente se queixa do estado da indústria mas pouca gente encontra formas criativas de expor o seu trabalho como vocês têm feito.
Sim, isso é uma preocupação nossa. Dar às pessoas algo que não conseguem sacar na net, como o box set ou os 7’’. Mas a música é a coisa mais importante e isso consegue-se basicamente de borla. Resta criar algo especial para as pessoas que querem algo mais que apenas a música. Mas somos uma banda de estrada e esse é um factor fundamental para nós. Na verdade, estamos melhor agora que alguma vez tivemos e não poderia estar mais grato. Para mim, as ruas estão pavimentadas a ouro e aprecio cada momento. A indústria está melhor que alguma vez esteve, porque não gosto de olhar para o passado, olho sempre em frente. Não quero saber dos “bons velhos tempo”, isso é tudo treta. O que interessa é o agora.

A ScionAV tem tido um papel importante na música independente actual…
Antes de continuares, recordo-te que gravámos três álbuns na Atlantic Records, que são uma corporação muito maior que a Scion. Seria demasiado estúpido da minha parte dizer o que seja da Scion quando tivemos três discos numa major. E se me vão culpar por isso, estão a ladrar à árvore errada. E a Scion está a oferecer o nosso EP de borla, de que é que as pessoas se queixam? O crime deles é dar música às pessoas? Não vejo qual é o problema e se alguém pensar que a Scion meteu algum dedo na música do nosso EP, está muito enganado.

Depois de «The Bulls And The Bees» gravaram com o Trevor Dunn, sob o formato Melvins-Lite. Como surgiu este projecto?
Há cerca de um ano atrás pensámos que seria fixe gravar um disco com o Trevor a tocar contrabaixo. E estávamos certos, foi muito fixe e é, de certa forma, uma extensão daquilo que fazemos, pelo que que vamos continuar com este formato, bem como com o habitual. É uma cena estranha para uma banda fazer, mas vamos continuar com as duas formações. Melvins-Lite são os Melvins com menos um membro e, eventualmente, teremos também os Melvins-Heavyweight, com dois baixistas, dois bateristas e eu. Fico no meio para me rebentarem com a cabeça.

E como correu o processo de composição com o Trevor e um instrumento como o contrabaixo?
Muito bem. É um instrumento muito interessante, com uma excelente sonoridade e muitas possibilidades. Quis que o Trevor brilhasse tanto quanto possível e dei-lhe todo o espaço. É um músico extremamente talentoso e quero que esta colaboração com ele dure para sempre.

Já o conhecias de Fantômas. Já agora, alguma novidade em relação a um novo trabalho?
Não há planos nenhuns para voltar a gravar. Pelo menos, que eu saiba, mas não tenho razões para pensar que tal venha a acontecer em breve. Mas estou disponível. Música é o que sei fazer na vida e nunca digo que não.

Entretanto, estão para chegar as eleições e, de repente, todos os músicos e actores têm uma opinião política. O que nos tens a dizer sobre isso?
Cada um pode dizer o que quiser mas prefiro procurar outras fontes para esclarecimento político. Músicos são peritos em música, não são peritos em política. O Dave Mustaine: toca numa banda chamada Megadeth, quão importante poderá ser esse gajo? Eu não seguiria um conselho seu sobre como atravessar a rua, quanto mais sobre política. Não me poderia estar mais a cagar, ele é um mú-si-co, não é comentador político.

Muitas bandas citam os Melvins como uma influência [ver em baixo]. Como te sentes em relação a isso?
Acho óptimo e há muitas bandas piores por quem ser influenciado. Somos uma banda esquisita, fazemos música estranha e somos todos weirdos, por isso ninguém percebe isso melhor que eu.

ME & THE MELVINS
Mike IX Williams – Eyehategod
Costumava questionar os meus amigos de cabelo espetado, acólitos do hardcore de t-shirt dos The Germs e bota da tropa, skaters e stage divers: “ E se houvesse uma banda que tocasse música lenta como os Black Sabbath (que adorávamos, para grande desgosto dos nossos pares mais puristas) mas que o fizesse num estilo punk rock, cru e pesado que se equiparasse ao estilo do ‘1,2,3,4,’ rápido daquela era?” Esta minha pergunta era não raras vezes acolhida com risos trocistas mas, eis que, anos mais tarde, depois de observar e absorver uma consciência cósmica comum, uma série de bandas começaram a formar-se, à direita e à esquerda. Gente que tinha os mesmos discos nas suas colecções, gente que assumia que o “heavy” era um feeling e uma emoção e que o compreendia, gente como C.O.C., Neurosis, Pentagram, Swans, Confessor, Celtic Frost, gente que celebrava o lado B do «My War» dos Black Flag, ou a hipnótica «Damaged I» do primeiro álbum… o vibe lento dos Black Flag em geral. Um grupo de músicos que planeou tornar este estilo como seu foram os Melvins. Não conheço a história completa do referido grupo, nem finjo saber, mas sei no que se inspiraram e sei o que deram de volta: a descoberta de uma liberdade criativa inédita na cena HC. Uma vaga mas directa linhagem é possível traçar dos Melvins aos Eyehategod, e não nos envergonhamos nada de o admitir. Passámos de ouvir o «Gluey Porch Treatments» 24 horas por dia, 7 dias por semana, a escrever a nossa própria música, nunca esquecendo as bandas mágicas que nos levaram por este bem-sucedido, embora destrutivo, caminho. Tendo visto os Melvins muito recentemente, posso verdadeiramente atestar a longevidade do seu poder e o respeito que lhes tenho é infindável. Obrigado Dale e Buzzo.

Kirk Lloyd Fisher – Buzzov-en
Os Melvins foram uma grande influência para Buzzov-en. Na realidade, o nosso nome nasce do Buzz e do segundo tema, «Oven», do álbum «Ozma» . Eram mais que uma banda pesada, com um estilo absolutamente único. Vi-os ao vivo com os Nirvana, mais ou menos na mesma altura em que estavam a promover o «Nevermind». Foi um grande concerto e o palco quase colidiu com aquele low end. Mantiveram a sua carreira, fieis às suas próprias ideias e humor, independentemente das opiniões externas. Sempre tentei mostrar às pessoas o «Bullhead» mas era muito difícil explicar que um disco com uma terrina de fruta na capa pudesse ser bom. Tocámos uma vez com os Melvins em São Francisco mas tivemos pouca interacção uma vez que já estávamos completamente descontrolados com as drogas, etc. Ainda assim, foi uma honra partilhar o palco com eles e sempre terei o maior respeito pelos Melvins, e a explicação para o nome da nossa banda diz muito sobre isso. Definitivamente no meu Top 5 de bandas da História.

Eugene Robinson – Oxbow
Os Oxbow tocaram com os Melvins um par de vezes, estivemos com eles em programas na televisão alemã e até bebemos um copo juntos com o Larry Flint no vigésimo aniversário da Hustler, onde o Buzz se referiu jocosamente à minha antiga banda punk Whipping Boy. A parte triste é que só me apercebi cinco minutos depois de ele parar. Mas sabes o que isso fez? Fez-me pensar que havia mais no Buzz e, por conseguinte, na sua música que julgava antes, e que era muito astuto e engraçado. Vai daí, ouvi tudo o que tinham feito e fiquei chocado ao descobrir tanta coisa além do que ouvia ao vivo. Os Melvins fazem merdas super sofisticadas que, provavelmente, apenas 10% do seu público está realmente a perceber. Se se convencessem que as caras engraçadas em fotos promocionais raramente têm piada, poderiam ser a banda perfeita. Espera. Acho que já o são.

Scott Kelly – Neurosis
O primeiro concerto de Melvins na Bay Area foi no armazém onde vivia e onde os Neurosis ensaiavam. Organizávamos concertos com outras pessoas que lá viviam, e éramos completamente obcecados por bandas como Amebix, Celtic Frost, Black Flag ou Black Sabbath (e ainda somos). A única coisa que sabia sobre os Melvins antes deles tocarem foi alguém me ter dito que os ia adorar, e tinha visto um autocolante que tinha uma flor desenhada por uma criança a lápis de cor. Não estava lá quase ninguém, cerca de 25 pessoas, e eles dizimaram a sala. Destruíram, mesmo. A carrinha deles ficou avariada no estacionamento depois do concerto e ficaram retidos no nosso armazém durante dois dias, ensaiando no quarto literalmente ao lado do meu. Faltei esses dois dias ao trabalho, dizendo que estava doente, e fiquei sentado no sofá a absorver o que eles estavam a fazer. Tenho sido um devoto desde então e não há banda no mundo que, aos meus olhos, lhes consiga tocar.