A Gata do Doom: Presences of Absences

Presences Of Absences is about sincerity, goodwill and compassion, honesty, hard work and in the deepest sense, thanks and reflection at the end of the day. It’s a discussion in music utilizing traditional elements and contemporary electric instrumentation to expose our shared origins, our pasts, presents, futures and the common thread passing through our relationships to all of it… – G.Stuart Dahlquist

Depois do muito bom What You Don’t Know Is Frontier, G. Stuart Dahlquist rodeou-se de novos elementos (Gregory Gilmore, Toby Driver e Jake Weller) e começou a compor sentado ao orgão (instrumento central do disco), com a ideia fixa de querer um álbum com uma intenção, com mais profundidade do que tinha vindo a lançar, sem estar preso a géneros que tornavam a música superficial. O resultado, e embora por vezes consigamos vislumbrar os antigos Asva (e.g., a abordagem ao baixo continua a ser agressiva), é quase uma antítese do doom. Os três diferentes tipos de orgãos, a voz celestial do Toby Driver, o balanço perfeito entre o peso e a contenção, a beleza minimalista e as diversas texturas, o facto de ser uma gravação caseira (é talvez mais notório no som da bateria), fazem deste um dos álbuns mais especiais e bonitos do ano passado.

Mais passarinhos?

Presences of absences é uma expressão retirada de Jayber Crow, livro de Wendell Berry, que surge numa altura em que o narrador e protagonista visita o cemitério onde se encontra a sua família – parte do excerto encontra-se no booklet do cd e podem lê-lo aqui – e o álbum parece ser um prolongamento ou banda sonora desse momento, uma espécie de elegia musical. Além de Jayber Crow, que conferiu ao álbum uma maior densidade emocional, as maiores influências do Dahlquist para a composição deste álbum foram Arvo Pärt (citando: “he uses very simple themes of pure tone with little, or in most instances no, vibrato, and repeats the phrases over and over in different combinations, pulling this or that out, adding this here, ascending lines, descending lines, lines starting from the middle of the phrase and moving outward or inward towards the center”) e o livro Interaction Of Color, do artista e teórico Josef Albers (foi-lhe dedicada uma exposição no CAM, Gulbenkian, muito recentemente). Uma das constatações mais simples de Albers é “The same color can look completely different based on its surroundings”, e Dahlquist aplicou esta e outras ideias (este site interactivo tem vários exemplos muito interessantes, para quem não conhecer o trabalho de Albers) à música.
Como acontece com quase tudo o que me diz muito, este é um álbum sobre o qual tenho muita dificuldade em escrever a um nível mais pessoal. Já escrevia Vergílio Ferreira: “Estamos condenados a pensar com palavras, a sentir com palavras, se queremos pelo menos que os outros sintam connosco. Mas as palavras são pedras.”, e por isso mais vale deixar aqui a peça central do álbum. Se não são os 24 minutos mais bonitos de sempre, está lá perto: