As Heroínas e os Métodos – Liz Harris (Grouper)
No filme Gravity, a eminência da morte revela-se como uma viagem no vazio com a melhor vista que algum sonho pode acalentar. O ser humano tão frágil e ao mesmo tempo tão deus. A solidão e o medo apresentam-se como garantias de coragem e sobrevivência. Em Gravity o vazio estende-se num negro indefinido, comparável às pinturas de Werner Knaupp, onde algo tão fascinante como o mar, pode igualmente ser visto como algo assustador. Esta dicotomia do belo e do temor carateriza a música de Liz Harris (Grouper), porque não é apenas a recordação do “homem que morreu no seu barco” que impulsiona este disco, mas sim a associação da morte (medo) e o vazio (fascínio?).
As composições de Liz não são feitas de cordas e ambientes clássicos ideais para acompanhar filmes, como a música de Hildur Guðnadóttir, Nest, Ólafur Arnalds ou Rauelsson. Isto para não falar dos geniais Górecki, Max Richter ou Arvo Pärt. A voz de Liz aproxima-se destes nomes por se revelar etérea, graças a doses consideráveis de reverb e delay, lembrando por isso Julianna Barwick– mas nas suas mãos cabe apenas o corpo de uma guitarra acústica, pontuada por um ou outro toque de piano. Os sons são sobrepostos e estremecidos por ruídos bons, podendo de uma forma fácil serem arrumados na pouco definida Dream Pop.
O disco “The Man Who Died…” foi gravado na mesma altura que um dos melhores registos de sempre de folk e drone, o disco de Grouper “Dragging a Dead Deer Up a Hill” – mais uma vez a referência à morte e a incursão desta na vastidão da natureza. A fita sonora é carimbada de forma a preservar um certo ambiente “caseiro”, facilitando assim o processamento de memórias em velhas cassetes, permitindo também que as belas melodias tenham algumas feições mais sujas.
Na altura em que se fizeram estas gravações já se previa projetos como Mirrorring (com Liz ao lado de Jesy Fortino – Tiny Vipers). Podemos também comparar o ofício de Liz ao proletariado sonoro da editora Fonal, mesmo que cada um dos nomes seja tão difícil de caraterizar – Islaja, Lau Nau ou Paavoharju, só para dar alguns exemplos.
Liz Harris, para além de se ter mantido nos últimos anos como uma das artistas mais interessantes da música experimental, não deixa também de se vestir pelos mistérios que são as suas criações – comparáveis ao ato de quando decidimos ouvir o clássico folk “Colour Green” de Sibylle Baier e ficamos a olhar para a capa do disco… ver ali Sibylle de olhos fechados no meio de uma seara (o vazio). O que estará ela a pensar/sonhar? Ao mesmo tempo que vamos sendo abraçados por cada dedilhado das suas canções.
A música de Grouper equivale a um vício, mesmo que o vício seja caraterizável pela ambiguidade da frase “a virtude é quando se tem a dor seguida do prazer; o vício, é quando se tem o prazer seguido da dor” – ao ouvir Grouper, o prazer é o mesmo que apreciar a melancolia e a tristeza.