Pensava eu que tinha deitado dinheiro fora (o outro livro mais conhecido da Feral HouseLords of Chaos – descamba várias vezes para as chachadas filosóficas do Varg em cerca de 1/3 das 390 paginas, e perde demasiado tempo, a meu ver, em entrevistas onde todos dizem essencialmente as mesmas coisas), mas, após percorrer este calhamaço que hoje aqui submeto à vossa apreciação, constato que a história da ascensão, queda e ressurreição do death metal e grindcore foi (e é), na realidade, algo de especialmente complexo e orgânico.

É uma história que se estende por ambos os lados do Atlântico e do Pacífico, na América, Inglaterra, Brasil, Japão, Polónia e Suécia (só para citar alguns dos países que geraram contribuintes para a definição destes géneros), mas foi a partir de meados dos anos 70 – desde que o punk inglês descobriu as possibilidades do DIY e que labels independentes se multiplicaram como cogumelos – que a música underground (de qualquer natureza), teve as suas sementes dispersas mais longe do que nunca, despedaçando o domínio das grandes editoras. Ora o death metal e o grindcore levaram – ou mais propriamente, afundaram – o significado de underground a outro nível completamente diferente; assim como o hardcore americano e o punk dependiam de circuitos locais de salas para trazerem as suas bandas às audiências, também o death metal dependeu do tape trading, penpals e conhecimentos mútuos: se não fosse por estes, o death metal e o grindcore não teriam chamado a atenção de público, labels e músicos, e, por várias ocasiões, se lê neste livro como o músico X finalmente arranjou uma demo da banda Y pelo amigo da banda Z, vendo de repente diante dos seus olhos novos caminhos para a sua própria arte, evidenciando assim a influência mútua que certas bandas tiveram em outras.

Este é em grande parte o conto de uma geração muito específica de músicos que cresceram no heavy metal tradicional, thrash e speed metal, punk, industrial e hardcore, absorvendo livremente a partir de todos esses géneros, e que procederam a devastar o mundo entre aproximadamente 1988 e 1993. Muitas bandas anteriores a esse período poder-se-iam gabar de terem influenciado o death metal com formas primitivas, ora seja o deathgrunt de Tom G. Warrior dos Celtic Frost ou a brutalidade e velocidade do thrash dos Slayer. Mas este livro não é sobre eles, nem aspira a ser ser. Os Possessed podem ter sido os primeiros a usar o próprio termo “death metal” e produzido um dos mais influentes álbuns para a génese do estilo (Seven Churches (1985)), mas esta também não é uma biografia de Possessed; contudo, todos estes indubitáveis padrinhos estão aqui devidamente mencionados. O foco desta obra é sobre os músicos sempre intermutáveis nos promíscuos lineups de bandas como Napalm Death, Death, Morbid Angel, Carcass, Obituary, Deicide, Entombed e Cannibal Corpse – todos estes foram descritos como os pesos pesados do género vezes sem conta em zines de todo o mundo, e isso é correcto: eles são e foram as bandas que iniciaram a loucura em massa que envolveu e propeliu o death metal.
Mesmo os obcecados pelo género descobrirão dentro deste livro factos que desconhecem sobre pessoas sobre as quais leram inúmeras entrevistas; encontrarão também alguns personagens de que provavelmente nunca ouviram falar, reminiscendo sobre amizades e feudos previamente desconhecidos, e descobrindo uma ou duas surpresas no que toca a social networkings inesperados.

Desde o seu auge no princípio dos anos 90 que o death metal voltou ao berço que o alimentou – o underground – muito contribuindo para isso a popularização do black metal escandinavo que surgiu sensivelmente a meio da década, agarrando manchetes e tempo de antena pela sua extremidade extra-musical, mas, sem death metal ou grindcore, o black metal provavelmente jamais teria existido. Até ao final da década partes dos dois estilos convergiram num género comum de metal extremo. Bandas como Emperor, Vader ou Akercocke devem tanto ao death metal como ao black metal, mas isso não é ainda tudo o que o death metal ofereceu ao mundo nos últimos anos. Não só o género lançou novas bandas bandas – como os Nile – tão boas quanto os seus antepassados clássicos, como também se infiltrou em todos os outros estilos de heavy metal e rock underground e mainstream.

A influência duradoura e a contínua vitalidade da cena death metal e grind deve-se, sobretudo, ao poder da sua música…muito antes de as tácticas “shock and awe” se tornarem um slogan para bombardear cidades de volta à Idade da Pedra, já o death metal e o grindcore estavam empenhados numa corrida às armas para produzir a música mais rápida, mais pesada e mais brutal do planeta (os apelidos de bateristas como Mick “Human Tornado” Harris dos Napalm Death e Pete “Commando” Sandoval dos Morbid Angel dizem muito sobre a sua habilidade), e foi esta ferocidade que marcou o género, não a letra, atitude ou aparência. O extremismo do death metal e grindcore encontra-se resumido nos vocais desumanos, guitarras a moer e blast beats viciosos, não em qualquer ideologia política ou religiosa. E, em contraste com o black metal ou o hip-hop, nenhum músico death metal ainda chegou a matar outro, mesmo que alguns deles o tenham veementemente desejado a certa altura.