Da literatura ao writer's block

Ontem, estive a reler – hábito anual, desde 2007 – um dos livros que mais me marcou em 25 anos de existência: A Nossa Necessidade de Consolo é Impossível de Satisfazer, de Stig Dagerman. Não deixa de ser admirável aquilo que pouco mais do que 30 páginas consegue transmitir. Por exemplo, a memória. Sim, a memória e uma evidente assertividade que, em certas alturas, mais parece um corta-e-cola do estado de espírito pessoal.

A verdade é que trabalho profissionalmente (e numa base diária) com palavras. E as palavras, utilizadas em excesso, consomem e cansam a mente. Pelo menos, isso acontece comigo. Se pensarmos que as palavras não são mais do que música, do que o conjunto de sons de um idioma, concluímos facilmente que nem sempre é fácil ser-se criativo, objectivo, excelso na conjugação da escrita. Não raramente, e tal como nas melodias, as palavras tornam-se gastas, repetidas, mal formuladas e pouco originais. Senti que era isto que me estava a acontecer.

Regressando ao ponto de partida, aquando da minha leitura, reparei numa frase sublinhada no livro (um hábito antigo e pessoal): “A mim, o talento torna-me escravo ao ponto de não ousar empregá-lo, tal é o medo de o ter perdido”. Era isso: a insegurança, o receio! Tinha-me proposto a fazer um exercício semanal neste espaço e, por causa de um medo idiota, bloqueei. Pensei que teria perdido algo pelo caminho. Até me questionei se a lista de ideias que tinha para desenvolver aqui faria, realmente, sentido. Se seria maior do que eu.

Posto isto, percebi: a conjugação de sons que conhecemos, mormente, sob a denominação de ‘palavra’ deriva do latim ‘parabola’. Isto é, uma narrativa curta, ou um interlúdio, se assim o preferirmos. Nem todas as palavras (e respectivas conjugações) são geniais, mas não devemos guardá-las cá dentro, sob pena de congelarem. A arte – mesmo a sublime e até a menos boa – deve ser partilhada, não é? Seja na literatura, na música, no cinema, na escultura, ou fotografia.

Portanto, servindo estas linhas como uma espécie de “libertação de medos”, acho que vou quebrar o silêncio. Obrigada pelo empurrão, Stig.