Entre o palco e a tela
Dois casais de classe média alta encontram-se pois os seus filhos andaram ao soco na escola. Casais esses camuflados com a etiqueta do costume, mas assim que o verniz estala é vê-los a perderem a sua arrogância e a tornarem-se conflituosos. O DEUS DA MATANÇA, peça que venceu um Tony em NYC, gira à volta disto. Yasmina Reza, a autora, diz no folheto que é distribuído à entrada, que não gostou de ver as pessoas a largarem gargalhadas, insiste que não era suposto terem essa reacção. A peça não é uma comédia, pelo contrário, é até um reflexo – se bem que por vezes exagerado – da nossa sociedade, mas a não ser que a encenação (algo convencional, diga-se) tivesse sido pensada para criar estes momentos cómicos, a verdade é que os próprios diálogos eram um rastilho. Os diálogos… os diálogos foram o ponto alto. Agora percebo porque é esta dramaturga idolatrada um pouco por todo o lado consegue, com pouco esforço, fazer com que estrelas de Hollywood subam ao palco das suas peças.
Já TERRA SEM PALAVRAS é uma peça mais experimental, é um monólogo onde durante 50 minutos a personagem questiona a sua criatividade após ter vindo dum local destruído pela guerra. Sente-se impotente artisticamente, sente que a sua arte não tem valor se não se conseguir articular e fundir com a paisagem que encontra/ encontrou. Num cenário simples (uma humilde sala de estar), esta é uma das peças à lá Estúdio Zero, um dos espaços mais intimistas e saudáveis para se ver teatro.
O amor é o amor, não interessa quem ou de onde somos. O estilista Tom Ford estreia-se brilhantemente no cinema para dizer isso mesmo em imagens. Podia ter sido uma relação heterossexual, mas o facto de ser homossexual também é irrelevante. Este é um dos mais belos filmes que vi nos últimos tempos, muito também por culpa de Colin Firth, a sua dor é tão natural e tão verdadeira que somos obrigados a sentir compaixão. Não termino sem dizer que esteticamente A SINGLE MAN tem um toque delicioso (desde o guarda roupa à casa da personagem) ou então tinha para mim que os sessentas não eram exóticos. Grande grande filme.
RUÍNAS é mais um documentário nacional de alta qualidade. O início é esquizofrénico, mas quando damos por ela ficaríamos no cinema horas e horas a assistir a um Portugal quase apocalíptico, um país cheio de… ruínas e a desaparecer. Muito interessante e imaginativo, não somos grande coisa no cinema mas nisto dos documentários não tem faltado talento. A quem assistir no cinema, surpreenda-se com Norberto Lobo na curta Canção de Amor rodada no antiguinho Brasília e Serralves. Após Rapace e agora esta “canção”, é esperar pela primeira longa metragem de João Nicolau com alguma ansiedade.