Eyvind & Jessika: assim foi
O início do concerto foi dado no meio da entrada, bem no meio das pessoas ainda de pé. Eyvind Kang surpreendeu os que esperavam para entrar na sala com os primeiros sons do seu violino e foi abrindo caminho para Jessika Kenney que logo a seguir iria aparecer. Desde as primeiras palavras se percebeu a presença de uma linguagem à partida estranha: o interesse que Jessika mostra pela língua persa eleva a experiência para campos que remetem o seu instrumento voz a abstrações que acabam em fortes transfusões emocionais. Nunca houve dúvida que as palavras de Jessika são o complemento certo para o universo de sons que habitam as composições de Kang. E esta voz, instrumento tão rico, permitiu uma tensão cativante que nunca se desequilibrou excessivamente para uma das partes durante o confronto entre cordas e palavras. Eram as palavras que iam funcionando como pequenosloops, mostrando um curioso e criativo trabalho vocal que conseguia, na simplicidade, um eficaz ambiente hipnótico. Kang usou na maior parte do tempo o seu violino, fazendo dele uma versátil caixa de possibilidades, ora com o arco ora com as suas mãos que usava para dedilhar as cordas, criando pequenas sequências rítmicas de vibrações ressonantes. Usou ainda um sehtar (instrumento de cordas iraniano) e uma guitarra, expandindo-se assim o leque de sons que já apenas com o violino nunca seria pequeno.
Tanto Kang como Jessika foram comunicativos, explicaram pequenos pormenores da sua música e fizeram as pessoas rir com a sua boa disposição. A curta distância que separou os artistas do público permitiu adensar a atmosfera de proximidade entre quem faz e quem ouve – como uma pequena sala de estar ou um estúdio familiar onde as pessoas se sentam pelo chão e recebem diretamente o que está a ser criado. Com dois nomes tão importantes e carregados de experiência como Kang e Kenney pouco podia falhar e nada falhou. Uma hora de contemplação, apenas com espaço para o requinte musical que já se esperava.”
David Alves in Mescla Sonora