Estou cansado. Hoje foi especialmente difícil acordar, já dormi umas horinhas decentes, mas nas 42 horas anteriores tinha dormido apenas uma. Também quem é que me mandou deslocar a Londres propositadamente para assistir a um concerto? Suportar diversas horas de viagens de avião, de comboio, de autocarro, e de metro, com direito às respectivas e alongadas esperas, suportar a superlativa inconstância do tempo e as súbitas chuvadas, suportar a embriaguez e os sotaques macarrónicos de determinados funcionários do sistema de transportes britânico, suportar as comissões bancárias cobradas por cada processamento com o cartão de débito, não suportar líquidos internos e ter que pagar para os verter, suportar as bandas de suporte, mas pior que tudo, suportar a companhia? E porque raio é que estes bónus deveriam ser considerados como um fardo a suportar? Alguns deles não constituem prospectos agradáveis, mas acabam por ser um mal benigno e por fazer parte da aventura e da recordação colectiva, eclipsando-se perante a grandiosidade do momento.
Depois de chegarmos ao centro de Londres e até irmos para o Koko, demos uns passeios por alguns dos locais da praxe como Leicester Square, Picadilly Circus, Trafalgar Square, London Bridge à Tower Bridge passando pela City Hall e Camden Town. Eram 18h30 quando chegamos ao Koko e pouca gente parava nas redondezas. Pouco tempo depois apareceu o Mr. Cookie [O felizardo de Neurosis que ainda ia para o Roskilde!], recomeçou a chover, e mandaram o pessoal formar uma fila, de maneira que ainda apanhamos mais alguma chuva antes de entrar, passava qualquer coisa das 19h. Depois controlamos uns lugares à maneira nas grades e toda a gente comprou a sua t-shirtzinha.
Conforme prometido num cartaz afixado na entrada do Koko, os Oxbow não foram os Oxbow, apareceram em forma de um dueto acústico, com o guitarrista e o vocalista a serem acompanhados no último terço da actuação por uma violoncelista. A sonoridade que praticam é de difícil catalogação, e se uma actuação eléctrica e de corpo inteiro com os restantes instrumentos já é algo surreal, uma performance como esta muito mais o é. Despojados da secção rítmica perdem em intensidade e atmosfera, ganhando os delírios vocais do Eugénio ainda mais protagonismo e vulnerabilidade, com o strip, os movimentos explícitos, o constante agarrar das partes baixas e aqueles poemas Art-Cock a afigurarem-se e a soarem ainda mais crus.
Antes dos Boris subirem ao palco decidi colocar os tampões nos ouvidos para me proteger dos possíveis excessos sónicos dos Japoneses, mas ao fim de 1 minuto já os estava a tirar. Eles começaram coisa rock e acabaram algo drone. Foi um início em compassos mais lentos com a sublime atmosfera da Farewell, a extraordinária música que abre o Pink, e avançaram para o ritmo acelerado do tema homónimo desse mesmo disco. Sem nunca perderem demasiado tempo com arrastados riffs drone ou compactas muralhas de feedback, mantiveram sempre uma atitude muito rock. A Wata [guitarrista] dá-lhe! Riffs, Leads, Solos, aqueles dedos franzinos acoplados nos braços franzinos suportam tudo. E o Atsuo [baterista] é um marado cheio de energia, com o gongo atrás dele para descarregar alguma, por pouco não aterrou em cima do André e do Mr.Cookie quando praticou stage-diving. Uma actuação poderosa que deveria ter sido um bocadinho mais longa.
Boris Setlist:
Pouco depois das 21h30 subiam ao palco os Isis, o verdadeiro motivo para ali estarmos. E o que posso eu dizer? Foi um concerto memorável, dificilmente não o seria. Estávamos mesmo ali à frente e o som apesar de longe da perfeição estava bem bom. Como seria de esperar reservaram lugar especial para o In the Absence of Truth, e como vinha sendo habitual até então nesta tour começaram com os 2 primeiros temas desse disco. Se é certo que a sonoridade deles tem vindo a sofrer algumas alterações ao longo dos tempos, em palco, a constância entre os temas dos diferentes álbuns é exemplar. As gentis passagens atmosféricas serenamente moldadas pela secção rítmica vão sendo ladeadas pela densidade e intensidade das guitarras [então quando se juntam as 3…], até à visceral purgação inerente aos possantes gritos do Aaron. Foi uma cativante celebração do início ao fim. É que isto em vídeo não tem metade da piada, estes gajos são uma instituição. A The Beginning And The End foi especialmente arrepiante, aquela secção intermédia provocou dos maiores berros da noite, que pujança! E a Celestial? Que colosso de Riffs!
Enfim, para a próxima tour se eles não vierem cá repetimos a dose!
Isis Setlist:
Wrists Of KingsNot In Rivers, But In Drops
So Did WeDulcineaIn Fiction
All Out Of Time, All Into Space
Holy Tears
The Beginning And The EndEncore:
Improviso com Eugene Robinson dos Oxbow
Celestial (The Tower)