Os Heróis e o Método: ler um mapa musical com a lupa de Giuseppe Ielasi
Partindo da pequena conversa que foi possível ter com o músico italiano, Giuseppe Ielasi (ver dados biográficos) e tendo como pano de fundo a tocar o EP Stunt (Schoolmap, 2008) – comecei a interrogar-me de que forma os micro-sons que se ouvem seriam captados, de que forma se constrói uma música que tanto tem pedaços de IDM, como Noise num exercício matemático de resolução de dados minimais.
Surge-me de seguida uma situação imaginária em que alguém pegava num monte de discos de vinil, atirava tudo para o chão e furiosamente pisava até estilhaçar os honrosos objetos. De seguida e num esforço ao acaso, começava a juntar os bocados pretos e colava tudo em rodelas toscas que ao regressarem para a sua cama de agulha iriam despertar sons estranhos, disformes em alguns casos. Será Ielasi a pessoa ideal para assumir o papel nesta história?
Questionei-o se parte desta construção poderia ser feita captando sons ordinários do dia a dia, por exemplo, um som metálico qualquer misturado com passos de pessoas no metro, a crispação da chuva… Para Giuseppe o processo raramente passa por uma busca do acaso. Segundo ele as coisas são feitas de uma forma estratégica, a colocação de microfones é pensada ao detalhe de forma a capturar as propriedades acústicas que estão “escondidas” em determinados objetos. Para ele trata-se de sons que podemos encontrar em qualquer lado mas que normalmente não procuramos por eles.
Quando ouvimos a sua música pensamos logo em ambientes digitais, onde estas são talhadas no computador num processo de copy-paste. Para Giuseppe há aqui um corpo criativo que tem um início nas captações com microfones, pequenos sons via gira-discos ou instrumentos diversos. Eventualmente os achados podem vir a ser limados eletronicamente numa fase final mas normalmente ficam muito próximos da sua captação original. O mais frequente é usar equalizadores para os alterar ou isolar a variação de frequências.
Na linha de músicos que se escondem por detrás de entidades como Autechre, Four Tet ou Flying Lotus, Giuseppe mantém-se num ofício também apelidado de electroacústico, mais corpóreo até. Perguntei ainda quais seriam os 10 discos que o moldaram para o músico que é hoje (a resposta sai em formato alfabético)…
Robert Ashley – Automatic Writing (Lovely Music)
John Cage – Two, Five, Seven (HatHut)
Jon Hassell – Dream Theory in Malaya (E.G.)
Infiniti – Skynet (Tresor)
Rolf Julius – Small Music Vol. 1 (Small Music)
Theo Parrish – First Floor (Peacefrog)
The Peuls (EMI Musical Atlas)
Eliane Radigue – Chry-ptus (Schoolmap)
Toru Takemitsu – Film Music by…. (7 cd box on Victor, Japan)
David Tudor – Neural Synthesis (Lovely Music)
Prosseguindo a formulação de hipóteses, interroguei o músico italiano acerca das intenções que se escondem nas suas criações. Haverá a clara intenção de “desconstruir” conceitos de forma a despertar novas perceções, como por exemplo, quando se tira um sample de um disco e se coloca o mesmo a andar no sentido inverso ou se altera as variações de um som que se captou… Para Giuseppe a tentativa é exclusivamente a de fazer música. Detesta a ideia de forçar os ouvintes em qualquer sentido. O mesmo diz sobre os concertos, que tenta fazer o seu melhor para criar um ambiente de escuta ideal, mas que este é apenas uma sugestão. A partir daí cada um deverá retirar aquilo que quiser.
Para além da sua música, tem demonstrado também vontade em promover a música que é do seu agrado, exemplo disso foi a editora que criou e manteve durante algum tempo chamada Fringes Recordings. Neste momento participa nas edições de duas editoras: Schoolmap Records (com Francesco Tenaglia) e Senufo Editions (com Jennifer Veillerobe). Na Senufo a intenção é editar músicos que têm pouca exposição (mas há sempre espaço para exceções). São esses músicos que despertam o interesse de Giuseppe Ielasi neste momento e muitas novidades irão surgir durante 2012. A intenção – que brinca como sendo uma estratégia suicida – é editar um ou dois trabalhos todos os meses.
Por esta altura já o EP “Stunt” tinha rodado algumas vezes e a seguir iria girar o disco “August” (12k, 2007) – tempo para deixar a porta aberta com aquilo que virá a seguir… Através da editora Entr’acte surgirá no início deste ano um novo disco a solo assim como um novo disco do projeto Bellows (partilhado com Nicola Ratti).