Novas Tipografias
A semana passada estava na California, por isso não pude escrever, mas como vou ficar por aqui mais um mês, vamos tentar esgalhar mais uns textos. Uma das coisas que lá quis ver foram exposições ligadas à street art, que atravessa um momento de validação por parte dos museus e através dos muitos livros que lhe são dedicados. Os quatro artistas de que queria falar são Usugrow, Retna, Chaz Bojorquez e José Parla.
O primeiro destes com que tive contacto foi José Parla, nascido em Miami, mas cujas composições referenciam bastante a Nova Iorque em que vive, numa espécie de mescla urbana, trazendo os tags das portas, transformando-os em linhas subtis e reformulando isso num contexto de galeria. O que acho mais apelativo é o balanço entre a subtileza das linhas e o grotesco dos fundos, a simularem quase sempre o efeito da ferrugem.
Comecei por ver exposições dele sem saber quem era, mas aos poucos fui prestando mais atenção, e nos últimos anos, ele cresceu para se tornar realmente um monstro nas galerias convencionais. Se lhe será suficiente continuar usar a mesma linguagem, para ficar na história, ou se tem de se reinventar, ainda não sei, mas é certo que anda a fazer muitas coisas bem.
As narrativas que ele estabelece nos quadro são obviamente abstractas, uma maneira de reter o pensamento livre na tela, e de assim preservar emoções, criando-se uma amálgama de coisas que podem ser apagadas e reescritas, mas que se preservam. Quando se fala de Parla, um dos nomes que é referido é o Americano Cy Twombly, e apesar de eu achar que representam lados oposto do conceito de belo, Parla não é nenhum fantoche e a sua arte é bastante legítima.
O que nos leva ao artista dos dois quadros que flanqueiam a imagem acima, Chaz Bojorquez. Um veterano, que começou por cimentar o estilo adoptado por muitos dos gangs de East LA, em 1969 começou a pintar uma figura que se tornou popular na comunidade Latino-Americana, o Señor Suerte, que pode ser visto abaixo, numa composição recente e mais desenvolvida. Apesar de ser uma das primeiras criações a partir de stencils e massivamente distribuído, o que espanta nele é a qualidade artística do seu traço, numa caligrafia que vai buscar muitas influências à tradição Chinesa.
Como podem ver pelo quadro abaixo, o nível técnico de Chaz Bojorquez é bastante elevado. A conciliação da cultura que ele representa, pondo em contacto tanto os Latinos como a nossa memória colectiva de outras civilizações, o urbano e o primitivo, é um espaço muito interessante.
Mas apesar da complexidade de Chaz, há uma outra pessoa cujo trabalho me fascina sempre que o vejo na rua.
Nesta imagem, do lado esquerdo aparece a tipografia de Chaz Bojorquez, e do direito, a de Retna. No caso dele, não sei explicar o que me chama a atenção, mas apesar de toda a simplicidade do alfabeto que construiu, cujas aparições são aleatórias, há algo na geometria das suas letras que me inspira e me faz sempre parar, quando vejo na rua.
Também de Los Angeles, Retna já ultrapassou a barreira dos 30, e a maneira como tem cativado audiências pelo mundo fora demonstra que a sua cruzada por murais encontra na fluidez uma representatividade que ressoa entre as pessoas.
O trabalho de linha, geralmente apenas com texto também é regularmente usado em colaborações com outros artistas, como The/El Mac, visível na imagem em baixo.
Algures entre a escrita hieroglífica, o Old English que influenciou muito do graffiti, e as culturas Asiática e Hebraica, o trabalho dele surge da ambiguidade dele próprio ser o produto de duas culturas diferentes. Ele não revela o que é escrito ou o que influencia cada mural ou quadro, mas julgo que isso é o menos, dada a beleza intrínseca que as suas letras têm.
O que nos leva ao último artista, e o mais secreto nas suas missivas, o Japonês Usugrow. Eu vejo-o como uma combinação dos outros três de que falei antes.
Neste caso específico, penso que para além da tipografia de Retna, a leveza de José Parla, também há ligações ao Señor Suerte de Chaz.
Desde 1993 que Usugrow desenha, e apesar de ainda estar algo distante do mundo Ocidental, ele tem tido uma grande divulgação através da cena de São Francisco, nomeadamente a Upper Playground e o Mike Giant. O trabalho dele aparece em bastantes capas de discos e marcas de roupa, e como parte do grupo Shinganist tem expandido o seu trabalho a outras audiências, no entanto, acho que lhe falta apenas aumentar a escala do que faz.
O estilo dele é bastante influenciado pela cultura Cholo da California, limitando-se a uma paleta a preto e branco, no entanto, o talento de Usugrow é inegável, até por se expandir por vinyl toys, roupa, tábuas de skate, entre outras coisas.
Espero que tenham gostado!