O “Ecological-Etiqueta-man” Vs. Abies nordmanniana
Hoje cometi a minha primeira ilegalidade em Helsínquia: *ijei num jardim público. Para ser mais preciso, nos belos jardins da universidade que se estendem ao longo do rio Vantaa. Mas devo admitir que tentei tudo para não o fazer, procurei ser finlandês ao máximo, mas a “portuguesidade” acabou por vencer e bem.
Passo a explicar, no centro da capital, em qualquer shopping, metro, etc.. pede-se 1 euro para descarregar as águas, algo que me recuso a aceitar (a não ser que os urinóis finlandeses fossem de ouro, o que não é o caso). Desde que cá vivo, tenho tentado integrar-me, ser norte-europeu, responsável, educado, ecológico, etc.. chamemos assim, o “ecological-etiqueta-man” – só me falta andar mais de bicicleta, mas de resto, preencho quase todos os requisitos, separo o lixo, não despejo gordura pelos canos, faço caixotes de lixo dos jornais para os desperdícios alimentares, não falo ao telemóvel nos transportes públicos ( um inquérito feito aos finlandeses revelou que era um dos actos sociais mais indesejáveis), etc..
Bem, hoje, antes do crime, mantive a minha muito recente postura nórdica e usei todas as técnicas possíveis do meu reportório para não vazar águas em público:
Tentei focar-me no que me rodeava, por exemplo o lindo chilrear dos passarinhos.
(- Que lindo, consigo ouvir dois cantares diferentes. Será um casal namorando? Será? Merd*, será que aguento até chegar a casa?)
Concentrar-me na beleza das meninas que passavam.
( – Hmmm, ah perna boa. Não me consigo concentrar, não adianta.)
Meditação transcendental de olhos abertos.
(-Nunca resultou comigo a paz transcendental, a energia cósmica, o vegetarianismo zen, e não é agora que vai resultar.)
A verdade era que a cada passo que dava a bexiga roía ainda mais, o cinto da etiqueta europeia estava cada vez mais insuportável. Comecei então a fazer contas ao tempo que demoraria até chegar a casa e percebi que não havia hipótese, tinha que recorrer a um jardim.
O primeiro que passei estava cheio de crianças e mamãs a passear.
( – Muito descarado e corro o risco de passar por perverso. Siga para o próximo.)
Eis que passo pela entrada dos jardins da universidade, uma centena de metros mais à frente. Portão aberto e ninguém na cancela. Entrei. Ali, todas as árvores e arbustos têm uma placa indicando a origem e o nome da espécie em latim. Percorri parte do caminho até chegar à Abies nordmanniana, a mais alta e larga de todas. Despejei-lhe as águas com a devida cobertura da sua imponência.
(-Ahhhhhh!!! Era o que faltava pagar um euro para *ijar. Ohhh!! Que alívio.)
O resto do caminho para casa foi feito com outro astral. Sorriso irónico quando passava pelos “ecological-etiqueta-men”.
(- Soubesses tu o prazer que me deu *ijar na vossa Abies nordmanniana)
Já na minha rua, entrei no quiosque frente a casa para comprar cigarrilhas. Como em tudo por aqui, há sempre uma lei. Agora não é permitido mostrar o tabaco à venda, ele está escondido atrás de uma caixa no balcão. E antes sequer de eu perguntar se tinham a minha marca, a cara do funcionário já estava respondendo que não.
– É possível ver quais as marcas de cigarrilhas?
– Não (acenando com a cara e sem sequer abrir a boca).
– Obrigado.
A vingança serve-se quente e numa Abies nordmanniana.