Os Heróis e os Métodos #2
Fire! Orchestra: Exit! (2013, Rune Grammofon)
Em relação aos últimos meses, alguns discos afirmaram-se como desafiantes, ambiciosos e em alguns casos extremamente bem sucedidos – falei na semana passada no trabalho de Matana Roberts, hoje é a vez dos Fire! em formato mastodôntico.
The Thing, Tape, The Ex, Tresspass Trio (que têm um disco interessante gravado com Joe McPhee em Coimbra, chamado Human Encore),Pärson Sound, Wildbirds and Peacedrums, Trapist, The Skull Defekts… pontos de referência de um mapa onde os Fire! foram buscar 28 músicos, grande parte deles situados na cena Sueca, seja a dar-lhe no free-jazz, música improvisada, avant-qualquer-coisa, rock ou noise.
Identificada a companhia, lançou-se o mote em torno da palavra Exit!, a necessidade de fugir, escapar, mudar… Juntaram-se todos ao vivo e edificaram uma homenagem de contornos épicos dividida em dois atos (se não formalmente, pelo menos faz sentido dessa forma). A segunda parte arranca logo em registo krautrock e termina num furioso ataque conjunto de free-jazz e noise. O primeiro ato apesar das várias expressões instrumentais, mais ou menos livres, tem no seu deambular duas variações de baixo e ritmo que parecem dignas dos rituais dos OM. Deliciosos os momentos entre o groove e as vozes femininas que tanto se recolhem como se apropriam das palavras com forte expressividade vocal. Aos poucos os diversos instrumentos vão encontrando o seu espaço, não caindo no facilitismo de edificar o caos.
Voltando ao ato 2, mais krautrock, provavelmente tentou-se homenagear nomes como Can, Faust, Agitation Free ou Amon Düül. No entanto, penso que é o nome de Pärson Sound a quem se deve fazer alguma justiça. Instituição sonora sueca, que no final dos anos sessenta gravaram alguns temas de rock experimental que ainda hoje fazem eco, basta ouvir o disco homónimo onde coabita distorção, free-jazz, krautrock etc.
Conforme a Fire! Orchestra vai-se aproximando do fim do espetáculo a fuga vai-se tornando cada vez mais claustrofóbica e intensa.
Após várias audições este disco continua a fascinar-me. Um trabalho desafiante e que apesar das diferenças, faz todo o sentido ao lado de outros bastiões sonoros como “Vision Creation Newsun” dos Boredoms, “Mekanïk Destruktïw Kommandöh” dos Magma ou “Execution Ground” dos Painkiller.
Julianna Barwick – Nepenthe (2013, Dead Oceans)
Elevados a um estado superior com o disco dos Fire!, torna-se necessário ficar a pairar na beleza da música de Julianna Barwick. Um disco ambiental, etéreo e marcadamente influenciado pelo legado dos Sigur Rós. Cada uma destas músicas parece uma tela e fariam todo o sentido a acompanharem os planos feitos por Terrence Malick em filmes como “To the Wonder” ou “The Tree of Life”. Mais do que uma banda sonora para a nossa nostalgia, percebe-se o toque feminino, delicado, quase sacro na forma como são ornamentados cada um dos temas. O trabalho minucioso que é aqui feito teve a ajuda orquestral das islandesas Amiina. A voz de Julianna ouve-se entre efeitos, como se fosse um coro expandido por cenários idílicos. Uma vez que este disco foi gravado na Islândia, faz todo o sentido imaginar a música de Nepenthe como banda sonora para acompanhar o visionamento de auroras boreais.