Taking the long way home… through Karlsruhe.

http://www.youtube.com/watch?v=M_xPxikw22A&feature=plcp

We lack the motion to move to the new beat!
— Refused, ‘New Noise’, 1998

É irónico que, década e meia depois do icónico alerta dos Refused, que entretanto voltaram meio requentados (Money buys the access – and we can’t pay the cost?), os miúdos estejam a provar que sim, que afinal até têm o movimento certo para a nova batida, e que até há quem esteja a dançar com as músicas certas, e que temos new noise – new art for the real people, se se souber procurar no sítio certo.

Um dos melhores sítios para se comprovar isso é em Karlsruhe, por alturas de Julho, anualmente. Num pequenino festival de um dia chamado, apropriadamente, New Noise, junta-se um maralhal de gente que, como é notório pelo video ali em cima, se sabe mexer a sério. Aquele tema foi o primeiro tocado pelos headliners deste ano, os sublimes Defeater, e aquele frenesim apaixonado não conheceu qualquer abrandamento durante toda a sua actuação, algo que aconteceu com a maior parte das 26 bandas que passaram pelas duas coloridas tendas de circo que fazem de palco.


Mas comecemos pelo princípio. Karlsruhe é uma cidade daquelas sobre as quais não temos grande imagem visual antes de lá irmos. Lembram-se os adeptos da bola do Karlsruhe FC, equipa de formação de Oliver Kahn que andou pela Bundesliga e que caiu agora para a 3ª divisão, mas não há um monumento ou um acontecimento que nos sirva de ponto de referência para o sítio. O que é pena, porque é uma cidade bem gira – calma, pacata, com uma rede de eléctricos bem esgalhada que evita grandes canseiras a pé seja para que lado se for, um jardim zoológico no meio da cidade e um ambiente propício às artes que se regista – por exemplo, um dos principais spots de actividade dá-se à volta do teatro municipal, o que é de valor.

Numa das “bordas” da cidade fica o Ostauerpark, sítio aprazível para ir apanhar sol no Verão, e onde uma vez por ano desemboca tudo o que é adepto da gritaria. O New Noise já vai na sua 7ª edição, e tem crescido de forma interessante, tendo hoje em dia um cartaz imperdível para quem quer que siga os novos meandros do hardcore, do screamo e até do emo, daquele que não é meloso e azeiteiro para os adolescentes com issues ouvirem enquanto se cortam. A review, propriamente dita, podem lê-la no número de Agosto da LOUD!, ou então em inglês aqui, mas basta olhar para o cartaz para perceber o fascínio da coisa:


O ambiente é de relax total. Aquela estranheza inicial para um gajo vestido de preto, de barba e cabelo comprido e t-shirt dos Neurosis que de repente entra num mundo maioritariamente composto por gente descalça ou de xanata, de calçãozinho curto e t-shirts brancas de Touche Amore, La Dispute ou pior, dissipa-se ao fim de poucos segundos pela boa onda e recepção unanimemente calorosa de que somos alvo por toda a gente. Sim, há uma identificação especial quando se passa pela única outra t-shirt dos Neurosis de todo o festival, há uma tentação irresistível de gozar um bocadinho com as figuras mais caricatas (a cruz tatuada na perna do vocalista dos Titan está toda torta, já agora!), mas estas histórias dos hipsters e seja lá mais o que for não passam de barreiras artificiais que criamos para dividir quem devia só ter pontos de ligação por gostar de coisas diferentes da maralha indistinta. Os penteados que se lixem – o rush sentido a ouvir o estrilho dos Birds In Row ou dos Loma Prieta é o mesmo que temos com, sei lá, os Trap Them, os Napalm Death, os Amenra (que já lá tocaram no ano passado e, espalhados pelas três bandas da Church Of Ra, andavam por lá este ano também), os Kreator ou os Asphyx. Can I scream?, perguntava o outro. Pode-se sim senhor, olha lá:

O próprio pessoal da organização revela uma abertura de espírito notável e não tem problemas em largar lá pelo meio bandas mais “fora” da orientação geral do festival, como os inigualáveis Celeste, por exemplo, que lá deixaram a sua caleidoscópica escuridão mais uma vez.

Acima de tudo, é um dia bem passado. Faz calor, há colchões e relva à sombra para a malta se espojar e descansar um bocadinho dos estampidos constantes, há boa cerveja (estamos na Alemanha, after all) e bancas de cachorros quentes (literalmente ao lado de bancas de organizações de defesa dos animais com ilustrações de porquinhos a dizerem que não são de comer), e a coisa despacha-se num instante. Leram bem – são 26 concertos num dia, com actuações a rondar a meia hora, o que é nitidamente a melhor forma de degustar a maior parte destas bandas. Não se perde o imediatismo, a urgência e a raiva, fica tudo condensado numa bola de densa fúria que se renova constantemente. E pronto, no dia seguinte até temos o dia livre para ir ao teatro. Eu já estou a contar os dias para o New Noise 8.

We’re not leading?
Isso são tangas, ó Dennis.